sábado, 12 de fevereiro de 2011

Quem Eu Nunca Fui Gosta Mais do Que Nunca Vivi

Um eu que existe mais do que apenas na imaginação. Meu eu que eu não sou habita as lembranças do que nunca vivi. Percorre por espaço/tempos, gozando de flashes de acontecimentos que sequer imaginei que pudessem ocorrer, mas que em algum lugar na escala de um tempo incompreensível, materializou-se de alguma forma, mesmo que nessas lembranças soltas.
É como se “deja vus” acontecessem, só que dessa vez de forma a não gerar um espanto de “já vi essa cena antes”, mas sentimentos de surpresa, desejo e saudade de situações experienciadas, mas alheias às lembranças de uma mente desgastada por rotinas e clichês, porém fortes numa escala que as coloca numa outra área da mente, que não as do pensamento comum.
É como se a alma estivesse te enviando um sinal sobre um mundo que foi experimentado outrora, numa não experimentação real, mas cujos efeitos das vivências emitem ondas que ao se chocar contra você, geram um som estrondoso que grita: “olha seu não-eu no seu não-passado, percorrendo uma parte da sua história que não existiu e que foi muito melhor do que essa ou qualquer outra que você venha escrever no livro da vida”. E completa: “E cuja experiência jamais você terá, pois seu eu nunca será o eu que você não foi”.
Então como tornar o meu eu melhor do que o meu não-eu, se eu não alcançarei em hipótese alguma o que eu não fui? Ou como lidar com vivências de um eu que anseia por não-vivências de um não-eu, ou seja, experimentar as mais saborosas lembranças capazes de me colocar num estado de frustração por não sê-las?
Uma música! Aquela música, naquele dia em que você estava exatamente onde deveria estar, falando com pessoas que realmente deveriam estar ali, vivendo aquele momento com você. Não poderiam ser outras, tal qual o assunto não poderia ser diferente.
Suas roupas não se parecem com as suas de agora. Você talvez nunca tenha pensado em usar aquelas, mas nesse momento elas casam perfeitamente com você. Tudo isso é quase um filme que passa em segundos, ajudando você a submergir ainda mais nessa atmosfera bucólica de não-experiências.
São muitos os sentimentos que atravessam o corpo, é vasta e detalhada essa lembrança, contudo, passando em segundos. Segundos que deixam horas de saudade apertada, de tentativas frustradas em completar essa cena, ou dar continuidade a esse pensamento, voltando a música que acabou de tocar para tentar reviver o que nunca viveu por pelo menos os minutos da melodia.
Porque o meu não-eu se apresenta muito mais eu do que o meu eu verdadeiro? Porque me entregar a essa aflição pós pensamento, que gera ansiedade em imaginar que talvez não esteja realmente vivendo o que deveria, ou experimentando um eu que eu não sou porque simplesmente ainda não tinha dado conta da possibilidade de que existisse?
Minha mente racional insiste em dizer que eu não conseguiria ser outro, enquanto minha mente do meu eu real diz que minha realidade é apenas uma realidade dada e nunca questionada com força, mas apenas recebida e vivida. Enquanto isso, meu não-eu, não existirá, e mesmo que queira, jamais será, talvez porque ele exista apenas não-existindo, talvez porque simplesmente o fato de me tornar meu não-eu, torne meu eu em um não-eu. E tal qual as encontrei em pensamento, sem viver as experiências desse eu que nunca fui, talvez eu perca as lembranças de um eu que fui e que agora não sou mais. Aí quem sabe eu deseje novamente me tornar essas lembranças do que vivi, mas esqueci.
Mas como é essa lembrança cênica de uma não-vivência que movimenta uma confusão dou sou feliz ou não, acho mais palpável entender que estamos fadados a um eterno desejo de um eu que nunca seremos e que gosta mais do que nunca vivemos.

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