segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Dar Nome aos Bois III - Subjetividade x Justificacionismo



Nesse terceiro capítulo, pesquisando um pouco sobre subjetividade e experiência dentro do contexto do porque das definições e rótulos, encontrei um texto de Adolfo Beria di Argentine chamado: A Síndrome da Subjetividade, do qual transcrevo alguns trechos.
Em geral o texto abre aspas quanto à subjetividade, mas mais do que tratar dela, o texto talvez esteja focado na questão das escolhas  - que é completamente subjetiva quando feita de maneira pessoal -, em relação ao sofrimento ou da própria subjetividade enquanto justificativa de "a vida é minha e ninguém tem nada a ver com isso", ou ainda "gosto cada um tem o seu", ou "é aminha opinião".
"Ao procurar compreender as razões profundas pelas quais a sociedade atual tem tanta aversão ao sofrimento, parece-me válido afirmar que tais razões se encontram na perda da virtude da paciência: a capacidade de suportar as tensões intermediárias da vida. (...)a sociedade moderna aprisionou-se numa opção sem saídas: bem-estar pleno ou a morte. Ou, em outras palavras, já não somos suficientemente fortes para suportar as tensões intermediárias:
- Um casamento não pode ter problemas: ou é maravilhoso, ou se desfaz;
- Um trabalho não pode ter suas dificuldades: ou é gratificante, ou muda-se de emprego;
- Um amizade não pode ter momentos difíceis: ou é total, ou torna-se indiferença ou ódio;
(...)não estamos mais habituados ao esforço, ao sofrimento das tensões intermediárias, e isto porque: ou perseguimos uma plenitude inatingível ou mergulhamos na depressão e na ruína".
Observando esse trecho, deparo-me com a possibilidade de talvez estarmos preocupados com uma rotulação em demasia ou mesmo uma necessidade de definição das vivências o tempo inteiro. Não conseguimos mais apenas viver, temos que ter um adjetivo ou substantivo extremista que nos coloque face a face com uma realidade ditada, sem reticências ou interrogações sem respostas.
Porém é preciso atentar-se para o fato de que não é porque as experiências e a própria vida são subjetivas, que tudo se justificará dessa maneira, antes, devemos entender que "nem sempre a carga de subjetividade que permeia um fenômeno ou um comportamento individual pode traduzir-se num direito do indivíduo a julgar e decidir por si só com relação ao fenômeno e ao próprio comportamento".
Sendo assim, procurar entender o mundo na forma de definições e rótulos, tal qual se esbarrar também na justificativa da subjetividade como forma de impor um modo de vida ou experimentação do mundo, seria elevar as vivencias a apenas extremos, quando nossa capacidade em lidar com o intermediário pode ser trabalhada.
E não somente trabalhar o entendimento sobre até onde vai a subjetividade, como também entender que uma busca por experiências que definam padrões e parâmetros contribuirá apenas para sucumbir a verdadeira experiência que até mesmo o sofrimento possibilita.
É sair de uma esfera egoísta da qual "a alta subjetividade atual dá lugar a um justificacionismo cômodo ao mesmo tempo que dramático em sua banalidade", e cair nos caminhos do entendimento da  diferença que realmente existe entre fenômeno e direito subjetivo.
Sem banalizar as experiências, procurando rótulos quantitativos que hierarquizem sentimentos, busquemos traçar metas para desbravar o mundo ao nosso redor, tentando extrair sem precisar de símbolos e manifestações de linguagem para alardear cada momento. E no silêncio do próprio espírito, preso-livre em um corpo com data de validade, nos doemos inteiramente para o que a vida nos oferece, de forma única para cada único, seja tomando coca-cola, fotografando, amando  ou experimentando os sentimentos sem se preocupar se é amor, porque ao final, o que vale é o que o caminho até o fim nos proporcionou e não a palavra que define que ele acabou.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Dar Nome aos Bois II - fotografia amor coca-cola



Dando continuidade ao capítulo anterior no qual estamos dissertando sobre rótulos e definições, inicio esse capítulo traçando uma crítica subjetiva em relação à fotografia.
Em geral acho a fotografia algo fascinante, porém acredito que em alguns casos, alguém que se preocupe muito mais em enquadrar uma experiência da qual está passando ou passará, não consegue se aproximar das vivências de tal experiência, visto que há um querer em converter o momento sentido em uma manifestação narrada por meio de recursos visuais, do que se supõe ter sido a experiência em si.
Não que a mesma não seja interessante ou valha a pena, porém não percorre os caminhos das vivências verdadeiras, pelo simples fato de haver a necessidade em definir por foto, algo que não tem em si mesmo qualquer definição capaz de exprimir o fato.
Saindo desse mundo mais íntimo da fotografia mais técnica e entrando em algo mais amador, caímos no mundo contemporâneo onde todos são fotógrafos nas redes sociais.
Há além dos já conhecidos álbuns em cada uma delas, uma rede social específica para postagem de fotos. Em ambos os casos, acredito que haja ainda mais forte do que a não-experimentação do que estão tentando enquadrar, uma necessidade da opinião alheia sobre a pseudo-vivência, para balizar se o que está na foto é realmente legal ou não.
E esse aspecto se intensifica na medida em que no Facebook por exemplo, temos um botão para curtir a foto dos amigos, mas não temos um botão para não curtir a foto, ou seja, ou eu concordo que o enquadramento da não-experiência é definido por uma provável sensação de "bacana" - visualmente sentido -, tal qual a própria não-experiência de quem a fotografou e acredita ter vivenciado de fato.
Em um outro aspecto mais delicado entra a questão do amor. É óbvio que todo mundo tenta manifestar opinião a respeito do que é amar e ser amado, classificar o sentimento e expressar "eu te amo" na mais intensa forma. Porém, como basear se o amor é mesmo amor, quando não é possível definir o que é esse sentimento que está tão além de quaisquer definições?
Não há um padrão, não há regras, nem leis que regem uma esfera do que poderia se definir como amor. Há apenas um monte de gente falando baboseiras das quais mais um monte de gente que tem preguiça de pensar acata, e então citam que amar é isso e aquilo, é se sentir dessa ou daquela maneira, é pensar dessa ou daquela forma.
Não estou dizendo que a partir de agora as pessoas não digam mais "eu te amo", estou apenas tentando dizer que há subjetividade no que cada um sente, e que querer traçar regrinhas de como o amor se manifesta, é querer trazer para uma escala medíocre de entendimento algo que jamais será compreendido de forma medíocre.
Então você pode passar a vida dizendo eu te amo por esse ou aquele fator, dizer que o outro te causa isso e aquilo, e no final das contas cair em si de que pode ser apenas um desejo forte ou uma série de outros fatores que te levaram a tentar inclusive justificar pra você mesmo dizendo que o que sentia era amor, por falta de entendimento dos sentimentos que jamais serão explicados, tendo então que defini-los de qualquer maneira. É o mesmo que querer hierarquizar o amor e dizer: eu amo mais fulano do que ele me ama. Porra! É amor, não há como classificar quantitativamente um sentimento desses.
O que não é o caso da Coca-cola. Você pode gostar mais ou menos que outras pessoas, porque estamos falando de algo banal, superficial  - não no sentido literal -, porém numa escala que envolve uma experimentação do líquido escuro subjetivamente e totalmente sem regras impostas visto que quando da tentativa de narrar para as pessoas que nunca o tomaram  - citando maneiras de melhor saboreá-la -, às vezes nos surpreendemos com o fato de depois de provarem a bebida, não gostarem. Mesmo depois de todo um enfatizar de sensações e sabores, ainda sim, não se deixaram levar pela magia que em cada um é diferente, exatamente por isso, por ser subjetivo.
A Coca-cola está ligada a um juízo de valor: gosto ou não gosto, enquanto que a fotografia pode ser entendida se analisada com um olhar mais crítico e menos individualista, e o amor apenas sentido sem interesse em rótulos do porque pode ser ou não considerado amor.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Dar Nome aos Bois I - A Voz do Povo Não é a Voz de Deus



Definir:  1. Dar a significação, o sentido, a definição de. 2. Explicar; revelar. 3. Determinar, fixar. 4. Decidir. 5. Decretar. 6. Ser definido; depreender-se.
"Quando você tenta definir [a Vida], consegue apenas a banalidade do niilismo formal, no qual o universo é visto como uma história contada por um idiota, cheia de sons e fúria, mas sem nenhum significado." Gustavo Cappelli.
Para entender a necessidade dos rótulos com datas de validade, sabores, números e imagens de design convidativo que nós humanos recebemos, temos antes que compreender nosso próprio desejo de auto-entendimento tal qual queremos significados concretos sobre o universo ao nosso redor. Quando falo do desejo, falo desse querer etéreo sem, contudo predispor uma ação real ou uma vontade latente e verdadeira em alcançar uma aspiração, tornando-se, portanto uma prática comum, sedimentada por já nascer em uma sociedade cujas definições são de fundamental importância.
E é provavelmente nesse círculo vicioso da educação para a vida, que se encontre a raiz dessa preponderante ambição em nomear o que se vê, sente, vive. Quando uma criança desde pequena começa a fazer perguntas, logo nos deparamos com um hábito em responder a tudo, dentro do universo dela, às vezes passando por situações de constrangimento em se ver diante do eterno, "mas porque?".
O que fazemos na maior parte das vezes é ditar para ela o que é o seu mundo ao redor, formatando-o em palavras soltas e vazias em si mesmas, e que, no entanto não dizem nada senão sons e vibrações ao ouvido. Imagine aquela criança peralta que insiste em querer colocar o dedo na tomada, e os pais insistem em impedi-la dizendo: "-Não pode colocar o dedo aí, que dá choque". Choque pela definição do dicionário é a passagem da corrente elétrica pelo nosso corpo; porém, muito mais do que o significado da palavra, levar um choque envolve um misto de sensações que poderia tentar descrever como adrenalina, susto, ansiedade, desespero, dentre outras; uma criança no entanto  jamais entenderá - ou mesmo nós adultos - o que é realmente levar um choque até que tenhamos passado pela experiência, sem contudo, preocupar-se em tentar defini-la depois.
É a partir das interações individuais e das subjetividades em experienciar o mundo é que conseguimos colecionar momentos que, de tão emocionantes tornam única a experiência do choque. E não adianta querer dizer que levar um choque é ruim, porque conheço pessoas que acham essa experiência algo interessante.
O problema das definições é querer acreditar que tudo que não foi catalogado de uma maneira ou de outra, deve ser considerado estranho, bizarro, inexistente, ou simplesmente precisa ser encarado como algo negativo. E levando em consideração o mundo em que vivemos onde a maior parte das pessoas caminha em direção ao fluxo, precisamos entender de forma clara que não é porque a maior parte da população acha que o choque é algo ruim, que ele é ruim e ponto.
Toda experiência é subjetiva, em todos os aspectos; é impossível que eu experimente o mundo de forma alheia. Por mais que observar uma fotografia seja observar a vida pelos olhos de um fotógrafo, ainda sim, quando olho para a fotografia e sou tomado de sensações, não há como eu igualar o meu olhar ao dele ou ao dos demais que a observam também. Desde a materialização da fotografia até sua exposição para observação, há, além de questões temporais, a diferença entre estar no lugar e enquadrar a foto, e observar a foto depois de revelada.
Querer definir todas as vivências é querer limitar o mundo de forma verbal. Experiências profundas não podem ser definidas, porque se forem explicadas por meio de palavras, não foram vivenciadas em sua totalidade, mas somente de uma maneira que possibilitaria um entendimento no âmbito da linguagem; e não é somente a fala que expressa tudo o que vivemos não é mesmo?
Não obstante, jamais pratiquemos a máxima mínima que diz: "A voz do povo é a voz de Deus". Se assim fosse, o mundo seria por interpretação, regido por um Deus confuso, pois eu sou um povo que não gosto de levar choque, fulano é um povo que gosta da corrente elétrica passando pelo corpo, beltrano é o povo que nem energia elétrica para possibilitar vivenciar essa experiência tem; logo, a voz do povo pode ser a voz da subjetividade.