sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Sem Título

Hoje não quero falar de felicidade. Não quero falar de amor nem de saudade. Não quero discutir as problemáticas do mundo contemporâneo nem os relacionamentos falidos.
Hoje eu não estou com vontade de sentir os cheiros da cidade, que volta e meia me aguçam o desejo em reconhece-los, desfrutando de momentos em que mergulho fundo no pensamento.
Hoje não quero o sabor do café preto e que amarela minha arcada dentária, mas mesmo assim eu amo. Como também não quero o frio da manhã antes de lavar o rosto e me abrir aos primeiros sinais de que estou mais um dia vivo e em busca desse dia.
Hoje acordei sem querer entender meu passado, apenas empurrar um pouquinho mais pra esquerda todos os recalques e angústias que nunca me abandonaram, deixando-os quietinhos atrás do coração, volta e meia transparecendo pela diminuição do órgão, no bombardear do sangue que me irriga.
Hoje é um daqueles dias em que pouco importa se vou trabalhar muito ou pouco, já que pouco importa como será o decorrer do dia, quero apenas vive-lo sem preocupações. Hoje acordei sem elas, as tais preocupações. Decidi que não quero falar, pensar ou sequer tentar resolver qualquer coisa. Se minha conta ficar negativa, se eu tiver que consolar alguém, se precisar ir à esquina pra comprar o leite que acabou, que fiquem como estão, não vou nem quero.
Hoje não preciso ler um texto de auto-ajuda pra tentar me sentir bem e encarar que sou suscetível a erros. Nem tampouco quero jogar tarot online para buscar uma paz de espírito sobre um futuro que não depende de cartas de baralho com desenhos engraçados e com nomes negativos que simbolizam coisas boas.
Hoje não preciso da música do rádio, da previsão do tempo na TV, do desfecho da história do cara que matou a esposa no jornal impresso. Hoje não preciso dos meus fones de ouvido para ignorar o mundo ao meu redor, ou experimentar esse mundo com uma trilha sonora.
Hoje não busco o significado de nenhuma palavra no Google. Nem vou responder a ninguém que me enviou mensagem, ligou ou deixou algum post no Facebook. Mesmo que de uma forma estranha, tais redes sociais me mantenham iludido em achar que estou cercado pelas pessoas que gosto.
Hoje não li o que meu signo diz sobre mim. Aliás, tenho sido mais as características do meu signo por achar que preciso me encaixar com o que o alinhamento dos planetas disse que eu seria quando nasci. Mas hoje não preciso desse símbolo nem desses significados.
Hoje quero não precisar de precisar. Quero não depender de dependências. Quero não ter mania de nada. Hoje eu não quero a rotina, como não quero sentir qualquer coisa a respeito da rotina, portanto, que a rotina se exploda, mas hoje eu não quero pensar nela.
Hoje não quero programar o final de semana, nem quero me arrepender por passar a maior parte dele dormindo de ressaca por noitadas de bebedeira e conversa fiada. Não que isso me cause arrependimento, mas hoje isso nada me causa, e quero que não me cause, porque hoje é o dia do hoje.
Hoje é o dia, não tem porque nem pra quê, é apenas um dia. Não quero colocar uma definição, quero ele seja como for, mas sem expressar opinião ou juízo de valor.
Hoje eu tenho o ar e água e os alimentos que não queria precisar. Não queria a obrigação de comer ou beber, queria apenas viver livre.
Queria mesmo não querer nada, porque estou transformando meu “apenas dia” no desejo de um dia de apenas. Mesmo abdicando de desejos, estou desejando abdicar deles.
Alguém por favor me desliga sem que eu precise pedir, quero apenas flutuar alheio a tudo, pelo menos por hoje.

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