segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Dar Nome aos Bois I - A Voz do Povo Não é a Voz de Deus



Definir:  1. Dar a significação, o sentido, a definição de. 2. Explicar; revelar. 3. Determinar, fixar. 4. Decidir. 5. Decretar. 6. Ser definido; depreender-se.
"Quando você tenta definir [a Vida], consegue apenas a banalidade do niilismo formal, no qual o universo é visto como uma história contada por um idiota, cheia de sons e fúria, mas sem nenhum significado." Gustavo Cappelli.
Para entender a necessidade dos rótulos com datas de validade, sabores, números e imagens de design convidativo que nós humanos recebemos, temos antes que compreender nosso próprio desejo de auto-entendimento tal qual queremos significados concretos sobre o universo ao nosso redor. Quando falo do desejo, falo desse querer etéreo sem, contudo predispor uma ação real ou uma vontade latente e verdadeira em alcançar uma aspiração, tornando-se, portanto uma prática comum, sedimentada por já nascer em uma sociedade cujas definições são de fundamental importância.
E é provavelmente nesse círculo vicioso da educação para a vida, que se encontre a raiz dessa preponderante ambição em nomear o que se vê, sente, vive. Quando uma criança desde pequena começa a fazer perguntas, logo nos deparamos com um hábito em responder a tudo, dentro do universo dela, às vezes passando por situações de constrangimento em se ver diante do eterno, "mas porque?".
O que fazemos na maior parte das vezes é ditar para ela o que é o seu mundo ao redor, formatando-o em palavras soltas e vazias em si mesmas, e que, no entanto não dizem nada senão sons e vibrações ao ouvido. Imagine aquela criança peralta que insiste em querer colocar o dedo na tomada, e os pais insistem em impedi-la dizendo: "-Não pode colocar o dedo aí, que dá choque". Choque pela definição do dicionário é a passagem da corrente elétrica pelo nosso corpo; porém, muito mais do que o significado da palavra, levar um choque envolve um misto de sensações que poderia tentar descrever como adrenalina, susto, ansiedade, desespero, dentre outras; uma criança no entanto  jamais entenderá - ou mesmo nós adultos - o que é realmente levar um choque até que tenhamos passado pela experiência, sem contudo, preocupar-se em tentar defini-la depois.
É a partir das interações individuais e das subjetividades em experienciar o mundo é que conseguimos colecionar momentos que, de tão emocionantes tornam única a experiência do choque. E não adianta querer dizer que levar um choque é ruim, porque conheço pessoas que acham essa experiência algo interessante.
O problema das definições é querer acreditar que tudo que não foi catalogado de uma maneira ou de outra, deve ser considerado estranho, bizarro, inexistente, ou simplesmente precisa ser encarado como algo negativo. E levando em consideração o mundo em que vivemos onde a maior parte das pessoas caminha em direção ao fluxo, precisamos entender de forma clara que não é porque a maior parte da população acha que o choque é algo ruim, que ele é ruim e ponto.
Toda experiência é subjetiva, em todos os aspectos; é impossível que eu experimente o mundo de forma alheia. Por mais que observar uma fotografia seja observar a vida pelos olhos de um fotógrafo, ainda sim, quando olho para a fotografia e sou tomado de sensações, não há como eu igualar o meu olhar ao dele ou ao dos demais que a observam também. Desde a materialização da fotografia até sua exposição para observação, há, além de questões temporais, a diferença entre estar no lugar e enquadrar a foto, e observar a foto depois de revelada.
Querer definir todas as vivências é querer limitar o mundo de forma verbal. Experiências profundas não podem ser definidas, porque se forem explicadas por meio de palavras, não foram vivenciadas em sua totalidade, mas somente de uma maneira que possibilitaria um entendimento no âmbito da linguagem; e não é somente a fala que expressa tudo o que vivemos não é mesmo?
Não obstante, jamais pratiquemos a máxima mínima que diz: "A voz do povo é a voz de Deus". Se assim fosse, o mundo seria por interpretação, regido por um Deus confuso, pois eu sou um povo que não gosto de levar choque, fulano é um povo que gosta da corrente elétrica passando pelo corpo, beltrano é o povo que nem energia elétrica para possibilitar vivenciar essa experiência tem; logo, a voz do povo pode ser a voz da subjetividade.

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