sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Emoções ou Emoticons?

Texto Publicado no Jornal Vale do Aço no dia 25/09/09

http://www.jvaflash.com/jornal/Flash/20090925/carrega_pag12.htm


O sol ainda não saiu, mas a claridade da manhã já entra pela janela do quarto. Você se levanta e vai ao banheiro lavar o rosto e escovar os dentes. A água está morna pois o dia anterior fez muito calor; e com aquele gostinho de hortelã na boca, você pega uma moedas e vai à padaria. Próximo dela você já é capaz de sentir os cheiros que exalam dos alimentos preparados lá – o cheiro do pão francês, o pão de queijo, o café passado na hora. Cheiros capazes de impulsionar as mais deliciosas sensações, que misturam imagens, sons e sabores.
E tal qual a vasta, porém, tradicional variedade de alimentos ali comercializados existem uma série de rostos que você só encontra na padaria naquela hora da manhã. Pessoas estranhas, mas que não tão estranhas se entendemos que a vida é uma grande comunidade composta de grupos menores. Como os “anônimos” que compram pão de manhã junto com você, existem os que estão sempre no ponto de ônibus, os que estão sempre na sala de espera do dentista, etc. São pessoas cuja rotina sempre esbarra com a sua em determinados lugares e por um curto período de tempo.
Um senhor que toma café todos os dias enquanto você escolhe o que comprar, sempre lhe dirigiu um bom dia que você devolvia, no início, sem entender muito bem o porquê da cordialidade daquele homem, mas que gradativamente habitou-se com o fato, no entanto sem estender a conversa.
Mas é especificamente nesse dia agitado em que você acorda mais cedo, preocupado em resolver tudo durante o dia, que ao chegar ao estabelecimento, você encontra o mesmo senhor entrando. Ele percebe sua presença e diz: - Bom dia! Caiu da cama hoje? E sorri. A frase que soou estranha seria a agulha que estouraria a bolha que até então te impediu de desfrutar das conversas que se desenrolariam todos os dias naquele pequeno intervalo da manhã, e que te levaria a descobrir as experiências de vida fantásticas que ele guarda tão vívidas na memória, e que tem o maior prazer em compartilhar.
Experiências que você nunca imaginou existir nas pessoas anônimas ao seu redor, pois antes de estourar, você possuía uma bolha de proteção que ficava pendurada, murcha, atrás da porta, e que você enchia e vestia todos os dias antes de sair de casa. E por quê? Porque se afastar das pessoas do seu cotidiano? Porque todo esse medo em exprimir um “bom dia” que poderá estabelecer uma relação social real? Porque reunir 999 amigos “anônimos” num site de rede social virtual e trocar suas emoções por “emoticons”? Não estaríamos demasiadamente deslumbrados com essa falsa experiência de convívio social ou mesmo experimentação do espaço real, que a internet tenta nos convencer de que é capaz de suprir, e que nos impede de perceber que estamos nos isolando da realidade palpável?
Abrir um programa que te mostra o mundo via satélite - com modelagens 3D de construções, mapas, relevos e ícones que direcionam para fotos e vídeos - jamais conseguirá transmitir a real experiência de fazer o percurso da sua casa até a padaria, vivenciando os sons, os cheiros, os mínimos detalhes que acontecem de forma efêmera. Pois as experiências diárias necessitam dos movimentos de um corpo vivo, latente, enquanto as virtuais necessitam de um “enrijecimento” desse corpo numa cadeira.
E tal como acontece em relação ao espaço, acontece também em relação ao convívio. Uma comunidade sobre alguma coisa, com um milhão de pessoas que se atém apenas ao título dela para mostrar o que são aos outros, não te proporcionará a verdadeira sensação de trocar idéias e inquietações com uma ou duas pessoas que não medem gestos, caras e bocas para colocar para fora suas opiniões.
Posso dizer que internet e vida real são como refresco artificial de laranja e a fruta. A primeira até consegue aproximar o sabor ao da segunda, mas jamais propiciará o toque ao apertá-la para sugar o caldo, o cheiro cítrico que exala da casca pressionada e chega a arder os olhos, ou a deformação final da fruta para degustação do próprio “bagaço”.

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