terça-feira, 16 de julho de 2013

Porto seguro




Ancorei em algum ponto daquela costa rochosa. Não deu pra deixar o barco tão próximo da margem e foi preciso entrar no mar e me molhar até a altura dos joelhos. A água estava numa temperatura pouco agradável. Não me lembro bem se era fim de tarde nublada, ou se era manhã fria de pouco sol, mas era tudo em tons de pedra, as mesmas que cercavam aquela ilha inabitada.
Minha blusa de lã era suficiente para proteger-me da brisa que insistia em jogar o líquido contra o sólido. E por um momento eu vi minha vida da mesma forma: como se todos os erros e quedas incidissem contra mim afim de tentar abrir brechas ou dar uma nova forma ao meu aspecto inanimado.
Com a corda nas mãos e os pés em terra (firme?), prendi o barco para que não fosse levado sem rumo, como eu fui, até chegar aqui. Não queria ficar preso, náufrago das desgraças e alimentando-me das minhas próprias dores.
Aportar no desconhecido que me habita não necessariamente significa me perder do que eu sou, ao contrário, era o encontro com aquilo que foi levado e que flutuou até ser jogado contra a ilha – que agora tenho a oportunidade de explorar.
Foram dez minutos de caminhada em subida leve, pisando sobre uma vegetação rasteira. Pequenas e minuciosas flores brancas arriscavam nascer e ser peculiares nesse ambiente hostil e pincelado com sobretons de cores agonizando.
O mar ficara para trás, mas sua presença era constante, inclusive no gosto forte que deixava no ar, que nessa altura se autodenominava vento. Ao longe era possível ver uma espécie de habitáculo feito com materiais locais. Mas quem habitaria o inóspito, o inócuo, o nada?
Não que ali não houvesse algo para oferecer, mas parecia limitado demais pra causar algum desejo de permanência eterna.
À medida que caminhava, o habitáculo parecia se tornar morada, e em determinado momento ficou de tamanho suficiente para acomodar confortavelmente um único morador.
Um pequeno muro de pedras serpenteava - ainda que com muitas interrupções - do entorno da casa até uns quinze metros em minha direção. Morria assim, sem muitas explicações, assim como mantinha uma altura que dava margem para questionamentos que iam da real necessidade de tanto trabalho para não obter a proteção necessária, ou se ele foi sendo desfeito na medida em que seu morador entendeu que não tinha do que se defender ali.
Do fim do muro até a entrada da casa a vegetação cedeu à insistência de pés que provavelmente pisavam-na diariamente, deixando à mostra uma camada de terra de um tom calcário. O caminho que resultava desse percurso, pedia gentilmente que eu tirasse aqueles sapatos molhados e dobrasse a barra da calça de uma maneira que não encostasse no chão.
Senti um pouco de calafrio, mas logo uma paz tomou conta de mim. Caminhei devagar, porque uma voz sussurrava para não correr, e de quando em quando, fechava os olhos do corpo para ver pela janela da alma.
Raios de sol frágeis transbordaram sobre as nuvens e derramaram gentis sobre aquela ilha. A incidência da luz tornou clara a visão do entorno, e o que parecia impossível ser visto, mostrou-se fácil e palpável.
Na porta da casa notei que era preciso entrar com cuidado, atento ao que me esperava, pois aquilo que fui buscar ali só deveria ser achado por mim. Ninguém jamais poderia ser meu porto seguro, a não ser eu mesmo!

Dei o primeiro passo e entrei! Quando estava dentro, a porta se fechou – mas eu tenho a chave - e poderei sair sempre que me sentir cansado e reprimido, afinal, espaço tem para que eu ande longe, mas sempre às margens de mim mesmo.

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